Um pedreiro, que trabalhava na Prefeitura de Arraial do Cabo como contratado no cargo de auxiliar de serviços gerais, se passou por empresário e recebeu do próprio município no qual era servidor mais de R$ 3 milhões e meio, entre os anos de 2018 e 2020. De acordo com as investigações da Polícia Civil, que culminaram na Operação “A Toque de Caixa” realizada pelo Departamento Geral de Polícia do Interior (DGPI) em parceria com o Ministério Público, Marcos Antonio Ferreira do Nazareth, o Marquinhos de Nicomedes, preso nesta terça-feira (18), usou o funcionário da Prefeitura como “laranja” e o apresentou como dono da empresa ATLANTIC CONSTRUTORA.
Ao mesmo tempo em que era contratado pelo município com salário de R$ 1 mil, Jerry Anderson de Araújo Silva, conhecido como Jerry da Coca-Cola, apresentou-se como dono da empreiteira e assinou diversos contratos com a Prefeitura de Arraial do Cabo, dois deles com dispensa de licitação. O primeiro negócio foi firmado apenas três meses depois da criação da empresa de fachada. Jerry está entre os 19 denunciados no caso.
De acordo com o relatório da Polícia Civil, “a ATLANTIC, que está em nome do “laranja” JERRY DA COCA-COLA, manteve contratos com a Prefeitura de 2018 a 2020, período em que o grupo político do qual MARQUINHOS DE NICOMEDES faz parte estava à frente da administração municipal, sob o comando do então prefeito RENATO MARTINS VIANNA, conhecido como RENATINHO VIANNA”.
Ainda segundo o documento: “JERRY DA COCA-COLA, na verdade, é pedreiro, morador da favela do Morro da Coca-Cola, e serviu, conscientemente, como “laranja”, em troca de pagamentos mensais. Durante os anos em que a empresa em nome de JERRY recebeu milhões de reais da Prefeitura de Arraial do Cabo, ele constava como funcionário do município em um cargo simples, mantendo vínculo duplo e de extremo opostos com a administração municipal. O mesmo JERRY que de um lado constava como um empresário, dono de empreiteira, com contratos milionários com a Prefeitura, do outro era um auxiliar de serviços gerais contratado do município”.
Segundo a polícia, a ATLANTIC foi criada justamente com a finalidade de ser usada para firmar contratos com o município. As investigações revelaram que a empresa foi constituída poucos meses depois do grupo político de Marquinhos de Nicomedes assumir o poder e, em três meses, já começou a receber verbas do município. Esses repasses tiveram um aumento impactante no último ano de governo. Na reta final do mandato de Renatinho Vianna, a Atlantic recebeu mais de R$ 2,7 milhões. Praticamente toda esta verba partiu do Fundo Municipal de Saúde, sob responsabilidade dos ex-secretários de Saúde Antonio Carlos de Oliveira, conhecido como Kafuru, e Paulo Roberto Trípoli Fontes, também denunciados.
Outra empresa de fachada pertencente a Marquinhos de Nicomedes, a M.A.F. DO NAZARETH INCORPORAÇÃO E CONSTRUTORA, também foi usada no esquema.
O relatório da Polícia Civil pontua ainda que, enquanto as empresas de Marquinhos de Nicomedes recebiam milhões de reais dos cofres públicos de Arraial do Cabo, ele fazia aberta e explicitamente campanha política em busca da reeleição de Renatinho Vianna. Nicomedes, que vem tentando nos últimos anos se eleger vereador e deputado estadual, já atuou como traficante internacional de drogas da quadrilha de Ném, da Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, negociando a compra de entorpecentes na Bolívia e Paraguai. Além de associação e tráfico de drogas, crimes pelos quais ficou encarcerado, Marquinhos de Nicomedes também tem passagens por ameaça, injúria, difamação e crime eleitoral.
A Operação “A Toque de Caixa” investigou políticos e ex-servidores acusados de lavagem de dinheiro e de desviarem recursos dos cofres públicos de Arraial do Cabo através de obras “fantasmas”.